sexta-feira, 28 de abril de 2017

O Lil Uzi Vert é ruim?

Eu li um artigo do Tom Breihan, que escreve para a Stereogum e é um ótimo crítico de rap que eu curti tanto que acho que valeria a pena traduzi-lo (com a autorização dele). Clique aqui para o original, abaixo segue a tradução.


Três videos. Primeiro vídeo: Em Fevereiro de 2016 o Lil Uzi Vert, um rapper em ascensão, visita o show matinal da Hot 97, um lugar aonde muitos rappers em ascensão são obrigados a visitar. Já no começo do vídeo o Ebro Darden, antigo diretor de programação da estação e auto-nomeado guardião dos portões do hip-hop, diz que vai por Mass Appeal do Gang Starr para que o Uzi mostre o que ele tem. Uzi torce o nariz. Ele está francamente enojado com a perspectiva. Ele se recusa categoricamente a rimar sobre essa batida. Ele não vai rimar numa dessas batidas dos anos 90 com toda essa bateria nela. Não é o que ele faz. Essa não música não significa nada para ele. Durante o curso da entrevista ele diz que 808's & Heartbreak do Kanye West mudou a sua vida. Ele diz que ele é um rockstar, e quando o perguntam com o que isso se parece ele diz "parece com o Marilyn Manson, Parece com o GG Allin." O tempo inteiro Ebro encara ele abertamente e silenciosamente se remói, deixando que os seus co-apresentadores carreguem a conversa, ocasionalmente lançando alguma merda mal-humorada sobre a sua "música de velho". Uzi tenta dizer a ele que as coisas são diferentes agora: "Vários caras novos vão vir aqui e eles não vão querer rimar nisso. Eu to tentado te dizer mano. Está mudando." Ebro, em outras palavras, quer que as coisas sejam de um jeito, mas elas são do outro jeito. E tá bom, tá bom, tá bom, o Ebro estava errado, o Uzi estava certo (Comentário: Nessa ultima frase ele brinca com o refrão de You Was Right do Uzi)



Segundo vídeo. Julho passado o pessoal na capa da edição dos Calouros da XXL se encontram em New York para sessões de fotos, entrevistas e coisas do gênero. Alguém os divide em grupos menores para filmá-los em cyphers de freestyle. Uzi por acaso fica em um grupo com o Lil Yachty, 21 Savage e Kodak Black - três outros rappers cuja existência diz muito sobre o gap de gerações no rap (o rapper underground da Flórida, Denzel Curry, um MC mais tradicional que aqueles quatro, está lá também, mas ele claramente não é parte desse novo Rat Pack do rap). Quando eles todos começam a rimar algumas coisas tornam-se aparentes. Primeiro, nenhum deles é um ótimo rapper. Eles são, no melhor dos casos, bons. Yachty faz uma rima double-time que não é terrível, enquanto o Kodak lança umas rimas habilidosas mas perde a linha de raciocínio e o 21 é tão terrível que chega a ser engraçado. Mas eles são carismáticos e eles gostam uns dos outros. Isso importa. O seu carisma coletivo cresce quando eles saltam de um pro outro. Uzi fica sendo o chefe das líderes de torcida, mandando um salve para todos os outros rappers presentes durante o seu verso e depois alegremente mandando ad-libs durante os versos dos outros. É contagiante. Quando o 21 Savage rima todos fazem o ad-lib "21, 21, 21". Quando o Kodak abre o verso dele se perguntando quem escolheu essa bosta de batida os outros se matam de rir. Esse vídeo tem só 9 meses mas já parece paleolítico. Esses quatro já assumiram o controle.


Terceiro vídeo. Russell Westbrook, o homem que provavelmente vai ser nomeado o MVP de toda a NBA quando eles anunciarem, está sentado antes do seu time enfrentar o Utah Jazz. As caixas de som da arena tocam "Do What I Want" do Uzi, da Perfect Luv Tape de 2016. Westbrook tem história com essa música. Ele postou um vídeo dele mesmo cantando essa música em Agosto e ele dançou ela (muito bem) para um comercial da Jordan Brand em Outubro. Há uma mensagem ali; com a partida do seu colega de time Kevin Durant, o Oklahoma City Thunder é agora o time do Westbrook e ele está livre para agir como um monstro, tendo um triple-double de média apesar do seu time não ter chance de ir bem nos playoffs. Westbrook faz o que ele quer agora e ele é sagaz o suficiente de escolher uma música que diga isso por ele sem precisar ele mesmo dizer isso nas contenciosas entrevistas que ele odeia. Mas toda essa narrativa nada tem a ver com a visão do Westbrook, no banco, alegremente cantando junto da música, fazendo caras e poses. É um contraste gritante com o jeito como LeBron James interage com o rap. Eu sempre amei os vídeos do LeBron se empolgando rimando versos atléticos do Eminem e Kendrick Lamar para ele mesmo durante os intervalos em jogos importantes. O Westbrook não está fazendo isso. Ele está se divertindo. Ele está flutuando com isso.



Eu vejo esses três vídeos e eu torço pelo Lil Uzi Vert. Como você poderia não torcer? Ele está olhando bem no olho da metade mais rabugenta do outro lado do gap de gerações do rap e falando para os seus representantes que eles estão errados. Ele está encontrando formas de apresentar a sí e aos seus amigos como parte de uma onda da nova geração e ele está fazendo isso parecer divertido, que é como deve parecer. O jeito iconoclasta e de "foda-se as regras" da sua música está causando uma dose de endorfina na figura mais iconoclasta do esporte hoje em dia. E então eu ouço a sua música e fico perdido. A música do Uzi é, para alguns de nós, uma pilula difícil de engolir. Ontem o David Turner escreveu um ótimo artigo sobre o Uzi para nós, explicando como o som do Uzi se desenvolveu e o que o destaca, o que o faz especial. Mas eu olho para a sua cara e eu só ouço "Yah! Yah! Yah! Yah!" repetidamente no meu cérebro.



Alguns meses atrás o Uzi chegou no primeiro lugar das paradas da Billboard graças à música de outra pessoa. Essa música é, claramente, Bad And Boujee dos Migos, um hino monstruoso e uma música que eu amo. É também uma música que eu iria amar mais se, digamos, o Takeoff rimasse ao invés do Uzi. O verso bola de cuspe e nasal do Uzi não é apenas a pior coisa de Bad And Boujee. Essa música é como se fosse uma bela pintura na qual alguém espirrou quando ainda estava úmida, e o verso do Uzi é a bola de meleca. É estranho no entanto; eu tenho uma aversão tão grande pelo verso do Uzi que eu não consigo tirá-lo da minha cabeça. Eu me encontro repetindo "Yah! Yah! Yah! Yah!" pra mim mesmo sem razão alguma. Nesse vídeo o Uzi usa uma camiseta do Marilyn Manson dentro de uma calça de moletom preta e eu acho que eu odeio ela tanto que eu estou começando a gostar. O jeito que o Uzi usa a sua voz, é quase como se ele não fosse um rapper. Tudo está naquele mesmo jeito cantado agudo que ele sabe que é desagradável. Uzi não me lembra outros rappers - nem mesmo o Young Thug, que ele basicamente começou imitando. Ao invés disso ele me lembra o Fat Mike do NOFX ou o Tom Delonge do Blink-182. Ele rima e canta mas mais do que isso, ele agulha.



Tem uma chance razoável do Uzi conseguir o seu próprio Número 1, sem o Migos, em algumas semanas. Na última semana a sua XO TOUR Llif3 entrou no top 10. De lá pra cá caiu do oitavo para o décimo lugar mas o Uzi está fazendo a sua parte para transformá-la numa dessas loucuras de dança do Instagram e essas coisas tem um histórico de serem bem sucedidas. Mas mesmo se ele não chegar mais alto que isso, XO TOUR Llif3 é o maior hit da carreira do Uzi e ela - junto com Mask Off do Future, atualmente algumas posições acima no top 10 - é um dos melhores exemplos do que acontece quando os fãs decidem qual será o hit. Uzi fez o upload dessa música junto com algumas outras no Soundcloud alguns meses atrás. Ela decolou dali organicamente antes de ter qualquer lançamento comercial. A gravadora do Uzi teve que mexer para acompanhar a demanda. Ela continuou subindo, e subindo rápido, e agora a gente tem uma música com um título que parece com algo do Aphex Twin no top 10.

XO TOUR Llif3 é uma música eficiente, uma meditação temperamental e obscura sobre drogas e separações. O seu refrão - "Me empurre até a borda / todos os meus amigos estão mortos" - é tanto um chiclete que fica incansavelmente na cabeça e uma entoada sombria sobre a vida nas drogas. A base do Uzi, as crianças seguindo a sua vida no Instagram, sabem que essa música é sobre uma separação recente, uma que eles assistiram às vezes em tempo real. Isso faz dela algo mais que uma música; ela também é um capítulo em uma história tocando ao vivo, um post de blog transformado em realidade. Entre a sua enunciação buzinada, a sua melodicidade cantada e a mostra do que está acontecendo na sua alma, ele é praticamente uma resposta atual do emo do MySpace do final dos anos '00. Aquela música era para adolescentes. Uzi também é.

Então o Lil Uzi Vert é ruim? Eu não sei. É uma questão quase que irrelevante e ela tem a mesma resposta que quando eu a fiz sobre o Lil Yachty no ano passado. Eu sou um homem branco de 37 anos com crianças e um cachorro e uma hipotéca e uma minivan. Eu não deveria gostar de Lil Uzi Vert. Se eu gostasse, algo estaria errado. Eu também não entendi o emo do MySpace e isso agora tem noites de nostalgia só pra isso em clubes no país todo. Um dia, antes de você perceber, uma geração toda estará nostálgica com "Do What I Want" e "You Was Right" e "XO TOUR Llif3". Eles vão fazer aquela cara de quem ama essa música e vão correr pra pista mais próxima e eles vão esquecer por algum momento que não são mais adolescentes. E nós que fomos rabugentos com o Uzi não seremos mais. Nós nem vamos estar na festa, pra começar. A gente vai estar dormindo, em casa, com um bom livro. Ou estaremos mortos.

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